Avaliação médica pré-participação – aspetos a reter
As horas de treino no ginásio aumentam rapidamente, as aulas de grupo que não consegue deixar de faltar e ainda o exigente crossfit que agora se parece ter entranhado nos treinos semanais. Surgem depois o calçado inovador, os tecidos mais leves, os batidos proteicos, entre tantos outros, que fazem parte das preocupações dos amantes do fitness. Mas há quanto tempo não diz “Trinta e três…trinta e três…”?
Seja nas aulas de cycling, seja nas aulas de crossfit, ou na passadeira do clube, adivinham-se as horas e os quilómetros que o vizinho do lado treina semanalmente. De facto, se por um lado vemos uma grande percentagem de portugueses que não pratica exercício físico, por outro vemos uma outra fatia, ainda que muito menor, adepta do exercício, que pratica de forma regular e assídua. Muitas vezes, tanto ou mais do que alguns dos atletas federados que, obrigatoriamente, necessitam de uma avaliação médica para ingressar a prática desportiva. Se aquilo que se impõe com a prática de exercício são os seus benefícios, nomeadamente para a saúde, é fulcral que seja feito de forma segura, após uma avaliação médico-desportiva. A lei portuguesa em vigor obriga a que “Todo o praticante desportivo deve ser sujeito a exames médicos de admissão e aptidão à prática do desporto, com a periodicidade adequada à respetiva idade, sexo e modalidade desportiva” apesar de, o exame médico-desportivo ter apenas carácter obrigatório para o acesso à prática desportiva no âmbito das federações desportivas. No entanto, a lei contempla que o atleta não inscrito numa federação tem “especial obrigação assegurar-se, previamente, de que não tem quaisquer contra -indicações para prática desportiva”. O que fazer então?
Numa perspetiva abrangente, a avaliação médica pré-participação serve para identificar fatores de risco potenciais para patologias agudas e crónicas e para recomendar intervenções preventivas ou terapêuticas. O objetivo primordial é detetar doenças ou condições em que a prática de exercício possa pôr em risco a saúde do praticante ou a de terceiros. A importância desta avaliação, complementada com a realização de um eletrocardiograma (ECG), tem sido largamente demonstrada. Um estudo de Maron, B. J. et al, que incluiu 4111 indivíduos jovens (entre 23 e 35 anos de idade) da população em geral, identificou 7 indivíduos portadores de cardiomiopatia hipertrófica (uma das principais causas de morte súbita em atletas), em que apenas um dos sete tinha tido sintomas cardíacos relacionados com a doença. Assim se compreende o grande interesse na realização desta avaliação para a deteção precoce de doenças cardiovasculares que sejam responsáveis por morte dos atletas, especialmente em indivíduos assintomáticos. Alguns sinais de alerta são a história pessoal de síncope ou a história familiar de doença cardíaca ou de morte prematura (antes dos 50 anos). Uma avaliação médica, complementada com determinados meios de diagnóstico, permitem a exclusão diagnóstica, rápida e eficaz, deste tipo de patologia grave, que cursa, muita das vezes, de forma assintomática.
A patologia cardiovascular é a mais valorizada, particularmente a morte súbita, pela tragédia e mediatização que lhe é associada, no entanto a avaliação médica pré-participação tem uma intervenção mais vasta, como seja a prevenção de lesões, a orientação do atleta em função da modalidade que pratica seja no que diz respeito à alimentação e hidratação, à medicação em curso ou a utilizar em casos específicos, ao alerta para substâncias dopantes, assim como para introdução de medidas particulares associadas a patologia já conhecida como a Hipertensão Arterial, a Asma, a Epilepsia, a Diabetes, entre outros. Nestes casos, o acompanhamento médico regular é importantíssimo e a articulação entre o médico e o treinador determinante. Muitas vezes são necessárias recomendações ou cuidados especiais, ajustes na terapêutica em curso, bem como do próprio plano de treino individual. A aproximação entre o fitness e os cuidados médicos é fundamental, quer pela importância da prática de exercício de forma segura, quer pelos benefícios claros que advêm desta sinergia.
Posto isto, está claro que uma avaliação médica anual, idealmente feita por profissionais de Medicina Desportiva, complementada com um ECG, prova de esforço e estudo analítico sumário (em casos particulares) é de todo indicada.
Para treinar em segurança não hesite em consultar o seu médico! Afinal de contas, dizer “trinta e três” não custa e a sua vida custa bem mais…!
Dr.ª
Maria João Sá






