Edição genética, nanobots na corrente sanguínea, médicos artificialmente inteligentes … a tecnologia está a mudar o Mundo a uma velocidade exponencial. E o que significa isto para o futuro dos cuidados de saúde, para a nossa vida e das nossas crianças? Deveremos simplesmente aceitar este desenvolvimento ou há razão para questionar ou, até mesmo, tentar orientar esta (r)evolução?
Nos últimos sete anos tenho trabalhado ativamente na prevenção de doenças potencialmente fatais, como o cancro, usando os mais recentes avanços na ciência médica e tecnologia. Durante este mesmo período, tenho testemunhado fantásticas melhorias naquilo que, enquanto médicos, podemos fazer pelos pacientes.
Apesar destes avanços significativos, quando participo como especialista em conferências, mesas redondas ou programas de TV, ainda é um assunto meio tabu falar sobre tópicos "a-ser-realidade-brevemente", tais como robôs a substituir médicos e tecnologias que permitem prevenir doenças e radicalmente prolongar a vida útil. Compreensivelmente, a maioria das pessoas sente que são tópicos difíceis de entender, mas há um pequeno grupo que acredita genuinamente que este futuro teórico se vai tornar realidade. O senso comum diz-nos que não pode ser verdade, tal como nos dizia que a Terra era plana. O nosso órgão mais fascinante, o cérebro, está novamente a enganar-nos.
Como neurocientista, sei que a velocidade estonteante dos avanços tecnológicos é algo difícil para o cérebro humano acompanhar, uma vez que o cérebro tende a antecipar o futuro de forma linear, em vez de forma exponencial. Entenda-se o significado de Exponencial, neste contexto: o próximo século será o equivalente não a 100 anos de progresso ao ritmo de hoje, mas a 20.000. Agora, considerando como o mundo mudou nos últimos 20 anos em relação ao uso dos computadores e smartphones, já tentou usar a imaginação para prever os próximos 20? Certo é que as tecnologias de ponta estarão disponíveis mais cedo que pensamos e, desta vez, não só no domínio das tecnologias sobre os nossos telefones e computadores, mas também no campo da medicina e da biologia humana: edição genética, robótica e nanotecnologia.
Edição genética - o fim das doenças?
Possivelmente está a pensar "a edição genética não é algo que me vai afetar durante a minha vida". Bem, pense novamente, porque a ciência de "fazer de Deus" já chegou e, por certo, vão afetá-lo(a). A revolução genética permitirá a reprogramação da nossa própria biologia e, por muitas razões, isso é excelente. Algumas pessoas dirão que deverá ser banida porque não se deve interferir com o curso da evolução natural nem devemos agir como deuses. Mas, novamente, quem dirá não ao combate e à prevenção de doenças como o cancro ou doenças cardiovasculares e ao prolongamento de uma vida saudável? Aliás, não será isso também estar contra a evolução? Afinal, não vimos programados por defeito para sobreviver? Basta pensar nisto: não ter que temer doenças como o cancro ou que o seu filho venha a ter uma doença rara com grande impacto sobre a sua saúde e vida. Isso significará que as pessoas, antes cegas, passarão a ver, os surdos passarão a ouvir e assim por diante.
Os robôs vão substituir os médicos?
Quando pensa num robô, provavelmente tem uma imagem parecida com o R2D2 (que me desculpem os amantes do Star Wars), mas os robôs de hoje estão muito mais inteligentes e "humanos". No campo da medicina, já os vemos a auxiliar cirurgiões há alguns anos, mas sempre com os médicos como responsáveis. No entanto, num estudo recente, um robô superou os cirurgiões e, inclusive, provou ser superior, mesmo quando a operar de forma autónoma. Há alguns anos atrás, o supercomputador Watson superou os médicos no diagnóstico de cancro do pulmão: Watson estava certo 90% das vezes comparativamente com 50% dos médicos especializados nesse campo. Há dois anos atrás, um computador AI passou no teste de Turing - o teste investiga se as pessoas conseguem detetar se estão a falar com máquinas ou seres humanos.
Agora, este é apenas o começo e nada está suficientemente maturado. Todavia, uma vez que a tecnologia se move muito rápido, isso poderá ser uma prática comum num futuro não tão distante. Na verdade, no preciso momento, estamos a testemunhar como a edição genética cria vacas sem chifres, Dálmatas cobertos de corações em vez de pontos e o primeiro advogado artificialmente inteligente do mundo ser contratado por um escritório de advocacia. Assim, a pergunta é: O que vem aí? Da mesma forma, apesar de ainda estarmos longe de nanobots, a nanotecnologia irá, provavelmente, avançar um dia para o outro estágio em que nos permitirá reparar e redesenhar partes do nosso corpo e cérebro, átomo por átomo. Por tudo isto, devemos aceitar ou temer estas tecnologias?
Convergência de genética, robótica e nanotecnologia
A história ensinou-nos que qualquer grande tecnologia tem o poder de fazer um grande bem ou um grande dano. É o mesmo com a genética, nanotecnologia e robótica. Da mesma forma, a convergência destas tecnologias será ainda mais poderosa e os seus benefícios e danos proporcionais às suas potencialidades.
As ferramentas de edição de Genes estão disponíveis há algum tempo, mas só os recentes desenvolvimentos nos permitem editar o genoma com muito maior precisão, velocidade e acessibilidade que anteriormente. Embora vá levar algum tempo até que a ferramenta de edição de genes possa ser usada com segurança em seres humanos, é inevitável que isso venha a acontecer porque será de grande vantagem para nós, pois ajudará a combater doenças e a viver mais saudável e por mais tempo.
Quando a bio-pirataria for possível, quais são as implicações éticas?
Poderá pensar que estas novas tecnologias chegarão passo-a-passo pela mão dos cientistas que trabalham no terreno e que tudo estará sob controlo de comitês éticos e de outras Autoridades. Mas, embora a ciência por detrás da edição genética seja complicada, a sua aplicação não o é. Dessa forma, o movimento "bio-pirataria" está a crescer muito rapidamente, o que significa que qualquer criança pode manipular a biologia, mesmo sem conhecimento prévio sobre engenharia genética.
Além disso, as implicações dessas aplicações podem ser bastante complicadas do ponto de vista ético e difíceis de controlar, mesmo para a comunidade científica, uma vez que os cientistas também são pessoas e, tal como foi dito antes, o cérebro humano tem dificuldades em compreender relações exponenciais e em analisar complexidades de forma racional. No entanto, devido ao rápido desenvolvimento nestes domínios tecnológicos, devemos realmente começar a discutir sobre como podemos beneficiar, o mais amplamente possível, destas tecnologias que mudam paradigmas sobre a Vida, limitando, ao mesmo tempo, o seu uso indevido. Não podemos perder tempo nesta matéria.
Sente-se preparado(a) para o primeiro médico do mundo artificialmente inteligente?
À luz do exposto, considere o seguinte: DOUTOR ROBÔ OU EU – QUEM ESCOLHERIA? Quando colocar essa questão para si, tente ser racional e não juiz. Recorde que hoje vive cercado de tecnologia, mesmo sem se aperceber. Tem Siri no seu iPhone, táxis autónomos serão uma realidade em breve. Esperançosamente, eu e os meus colegas médicos vamos encontrar o nosso novo papel no futuro, possivelmente como parceiros do Doutor Robô, proporcionando-lhe a melhor saúde possível, em equipa. Ou, talvez, o doutor Robô tornar-se-á tão humano e verdadeiramente empático que, simplesmente, preferirá ter não só a sua capacidade intelectual para a segurança de diagnóstico, mas também o seu excecional entendimento dos seus sentimentos e sua incrível capacidade de ouvir e de o(a) aconselhar sobre questões complexas na área da saúde e da vida, no geral.
Como médica, eu aceito tudo o que possa melhorar a saúde dos meus pacientes. Portanto, eu contrataria o primeiro médico do mundo artificialmente inteligente para a minha clínica. Então, caro doutor Robô, seja bem-vindo à minha prática! Fico na expetativa de muitos anos de grande cooperação!
Mouna Esmaeilzadeh
• Fundadora e Chief Medical Officer da SciLife Clinic
• Médica desde 2005
• Doutoramento em Neurociência em 2011
• Estudante e professora de Filosofia





