A Doença de Parkinson é uma das doenças do movimento mais prevalentes e é considerada a segunda desordem neurológica mais comum. A doença afeta, geralmente, indivíduos acima dos 50 anos de idade e a prevalência é estimada em cerca 13.000 pessoas afetadas em Portugal (APDPk, 2014). É uma doença crónica neuro degenerativa, caracterizada por sintomas como acinesia, rigidez, tremor de repouso e diminuição do equilíbrio, que estão relacionados com o défice dopaminérgico da via nigroestriatal (Bello & Fernandez-Del-Olmo, 2012).
Estes indivíduos enfrentam dificuldades e limitações nas atividades da vida diária e na mobilidade que levam à perda de independência, inatividade, quedas e isolamento social, resultando numa diminuição da qualidade de vida (Keus et al., 2014). Apesar da ótima terapia medicamentosa e neurocirúrgica os indivíduos com DP continuam a experienciar deterioração das funções corporais, atividades da vida diária e participação (CIF - Classificação Internacional de Funcionalidade). A fisioterapia na reabilitação da DP tem principal enfoque nas transferências, função do membro superior, equilíbrio, prevenção de quedas, marcha, capacidade física básica e prevenção da inatividade e também em áreas adicionais como a dor e problemas respiratórios (Keus et al., 2014).
As principais ferramentas terapêuticas para atingir estes objetivos são várias e podem ir desde as técnicas mais tradicionais até à utilização de pistas (cuing strategies), treino na passadeira, estratégias de movimento cognitivas, modalidades de exercício, artes marciais e dança (Tomlinson et al., 2014).
Contudo, uma revisão sistemática recente refere que apenas existe evidência do benefício a curto prazo da fisioterapia nestes indivíduos devido à baixa qualidade metodológica dos estudos desenvolvidos, em particular devido ao curto período de follow-up (Tomlinson et al., 2012). Também não é possível identificar se existe algum tipo de intervenção de fisioterapia mais eficaz ou mais adequada do que outra, devido à pouca quantidade de estudos comparativos realizados (Tomlinson et al., 2014).
O exercício, em particular, durante muitos anos não era uma estratégia de reabilitação recomendada na DP, uma vez que se acreditava que não tinha nenhum efeito mensurável na doença ou até que poderia piorar a patologia subjacente e deveria, portanto, ser evitado (Hirsch, M & Farley, B. 2009)
Apesar disso, hoje em dia, são cada vez mais os estudos de intervenção que utilizam o exercício e que relatam principalmente possíveis benefícios ao nível da flexibilidade, força muscular, marcha, equilíbrio e capacidade física (Roy & Roy, 2012), prevenção de quedas, independência funcional e severidade da doença (Tomlinson et al., 2012).
Para além destes potenciais benefícios, a literatura aponta outras áreas em que o exercício pode ter efeitos significativos, embora, em muitos casos, os mecanismos de ação não sejam ainda conhecidos e o nível de evidencia seja, para já, insuficiente para afirmar uma relação de causa-efeito concreta.
Os potenciais benefícios do exercício em indivíduos com DP podem também estender-se a:
• Melhoria da função cognitiva, em particular da função executiva (Tanaka et al., 2009);
• Prevenção de eventos cardiovasculares e da osteoporose, principalmente devido à quebra do ciclo da inatividade;
• Diminuição da severidade da depressão, que é um sintoma comum da doença de Parkinson;
• Melhoria no sono, cujas disfunções ocorrem em dois terços desta população;
• Diminuição da obstipação, um dos sintomas mais frequentes na DP, chegando a ocorrer entre 50 a 80% da população;
• Diminuição da fadiga, presente entre 30 a 50% dos indivíduos com DP;
• Melhoria da absorção da Levodopa durante a atividade física e à otimização da via dopaminérgica, o exercício pode potencialmente influenciar a produção e libertação endógena de dopamina, melhorando assim a neurotransmissão dopaminérgica (Speelman et al., 2011).
Em indivíduos com DP tem sido sugerido que exercícios que incorporam treino de capacidades motoras baseadas em objetivos, ou seja, a prática de atividades que levam à melhoria da performance, como a marcha e o equilíbrio, e que incluam nos seus parâmetros intensidade, repetição, especificidade, dificuldade e complexidade são importantes para a neuro plasticidade. Sendo que a componente de ‘cognitive engagement’ tem sido considerada importante para ativar circuitos cognitivos relevantes na aprendizagem motora (Nieuwboer et al., 2009; Petzinger et al., 2013; Sehm et al., 2014).
Os estudos que utilizam programas de exercício estruturado, em particular os com enfoque no equilíbrio, tem um efeito positivo na melhoria da estabilidade postural e/ ou em reduzir a incidência de quedas e lesões. Estes programas de treino de equilíbrio fornecem exercício num contexto específico orientado à tarefa e movimento funcional, desafiando a posição do corpo no espaço através da modificação do tamanho ou forma da base de suporte (Kaesler et al., 2007; Lange et al., 2000).
O indivíduo deve conscientemente controlar os seus movimentos, solicitando um maior recrutamento neuromuscular, recorrendo ao feedback verbal dado pelo instrutor e a estratégias de atenção, num ambiente supervisionado, possibilitando a facilitação da aprendizagem (Nieuwboer et al., 2009). Para além disso, o feedback desafia os indivíduos com DP a irem mais além dos níveis de capacidade auto selecionada percebida, mantém a motivação e ajuda os indivíduos a tornarem-se cognitivamente conscientes acerca de movimentos que eram anteriormente automáticos e inconscientes (Lange et al., 2000).
Em suma, existe crescente evidência que aponta para o benefício do exercício como um instrumento terapêutico em indivíduos com a doença de Parkinson e que pode ter um importante papel na promoção da independência, autonomia e qualidade de vida desta população.
Catarina Jácome
• Terapeuta
• Licenciada em Fisioterapia - EES IPS(2004)
• Especialização em Parkinson Pela University of South Florida College of Medicine e National Parkinson Foundation EUA (2007)
• Certificação em LSVT BIG® -Alemanha (2011); MDS Allied Health Professional Summer School: Physiotherapy for people With Parkinson Diseases - Holanda (2013)
• Vários anos de experiência clínica exclusivamente em Doença de Parkinson e Parkinsonismo na Associação Portuguesa de Doentes de Parkinson.