Em 2012, Portugal passa a ser um bom exemplo no contexto da Europa, ao nível do enquadramento técnico na área do fitness de acordo com patamares de exigência e de qualidade na formação inicial dos agora designados por Técnicos de Exercício Físico.
As atividades profissionais na área do desporto têm historicamente um papel relativamente secundário no contexto social das profissões. A título de curiosidade, no ensino oficial, o Prof. de Educação Física chegou a ter um vencimento diferenciado, leia-se, menor que os professores das restantes áreas profissionais. Também na área do fitness e até há poucos anos atrás, bastaria pouco mais do que ter sido um praticante regular e intenso de ginásio, para estarmos perante um possível profissional do setor.
Até ao ano de 2009, a atividade profissional do então vulgarmente designado instrutor de ginásio, não tinha qualquer exigência académica ou profissional. As entidades formadoras tinham o seu modelo de funcionamento que passava por formações de cada horária variável, normalmente a rondar as 100 a 150 horas de formação, e que dotavam os formandos de competências na área da musculação e cardiofitness, aulas de grupo, personal trainer e outras áreas afins. Apesar de existir este modelo de formação de certa forma informal, a verdade é que o mercado se auto-regulava e como tal não existia um nível de exigência mínima em termos de formação, para poder se instrutor e trabalhar num ginásio.
Em 2009 surge um enquadramento legal que colocava uma exigência académica nos profissionais do exercício físico, definindo que os mesmos teriam que ser licenciados na área da Educação Física e Desporto. Este enquadramento teve um regime transitório até outubro de 2011, período no qual os profissionais no ativo podiam requerer a sua Cédula Profissional, mas em 2012 surge a revogação desse diploma através da Lei n.º 39/2012, atualmente em vigor.
Chegámos assim aos dias e hoje, passados que estão cerca de 10 meses após a entrada em funcionamento das primeiras turmas do curso de Técnico Especialista em Exercício Físico (TEEF), curso esse que resultou da efetivação da Lei n.º 39/2012 já referida. Com o curso a funcionar há quase um ano, que balanço é possível fazer?
Pensamos que existirão 3 consequências da maior profissionalização da atividade profissional do instrutor, agora designado por Técnico de Exercício Físico:
a) A preparação de profissionais altamente qualificados para um setor que cresceu 19% no número de sócios de 2013 para 2014, de acordo com o Barómetro da AGAP do ano de 2014. Não há muitos setores da economia que possam apresentar valores de crescimento desta ordem, e que espelham a forma como o setor do fitness conseguiu ultrapassar os dolorosos anos da crise económica e social em que o país esteve mergulhado.
b) A melhoria da imagem dos espaços de fitness, junto do segmento dos prescritores do exercício físico, nomeadamente da classe médica, que teve sempre alguma desconfiança sobre a credibilidade do sector do fitness. Julgamos que esta desconfiança resulta do facto da classe médica não reconhecer no setor do fitness, um nível de competências técnicas adequadas para lidar com a saúde e condição física das pessoas não saudáveis ou que apresentem necessidades de acompanhamento técnico mais específicas.
c) Um aumento da qualidade do serviço prestado nos espaços de fitness, mercado que regista uma taxa de cancelamentos muito expressiva. A Attrition (1) é uma variável que permite objetivar esta realidade e revela-nos um valor de 58%, valor este que subiu em 2014 relativamente a 2013, de acordo com os dados uma vez mais retirados do barómetro da AGAP de 2014.
Qual a expetativa que podemos criar relativamente à chegada dos TEEF ao mercado de trabalho?
Uma questão prévia que podemos colocar, é saber de que forma é que os TEEF serão absorvidos pelo mercado de trabalho. Falamos de profissionais que realizaram um curso de formação inicial com 850 horas de formação específicas em vários domínios do conhecimento associados diretamente e indiretamente ao exercício físico na área do fitness, horas a que se soma a prática em contexto de trabalho (estágio) com mais 400 horas. Os primeiros formandos do curso TEEF estão neste momento em estágio, procurando a sua oportunidade de ingresso no mercado de trabalho. A taxa de empregabilidade do TEEF será um tema a que fará sentido voltar daqui por uns meses, após decorrer algum tempo após o fim das primeiras turmas do curso.
Pesa embora o nível de incerteza sobre a empregabilidade do TEEF, pensamos que será inevitável que o mercado de trabalho sofra as seguintes transformações:
1. Uma maior profissionalização do setor e estabilidade dos quadros técnicos, reconhecendo nos TEEF, profissionais qualificados num diverso conjunto de competências técnicas, pessoais e sociais, que vão da qualidade do serviço, das vendas, da coordenação e da gestão, e com grande destaque para a área das diversas atividades de fitness, complementadas por conhecimentos de nutrição, de primeiros socorros, da pedagogia, da psicologia e do coaching, citando apenas algumas.
2. Um aumento da satisfação dos clientes, traduzida numa diminuição da Attrition e consequente aumento da Taxa de Retenção ou Fidelização dos clientes, variáveis muito sensíveis do mercado.
3. Uma aproximação cada vez maior aos benefícios que a atividade física tem, não apenas fisiológicos, mas também de bem-estar físico e emocional, desde que enquadrada por profissionais qualificados. Podemos ver aqui uma oportunidade para um desejo que setor tem de ver reduzida a taxa de Iva, bem como uma consciente perceção de que o exercício físico pode contribuir para uma melhoria da qualidade de vida das populações.
4. Os formandos que fazem o curso TEEF, revelam uma grande disponibilidade e interesse em prosseguir estudos para o ensino superior na área da Educação Física, nas suas diversas ramificações. Pensamos que daqui por uns anos, um setor que tem um conjunto significativo de técnicos com formação académica superior bem como uma formação profissional especializada, será um setor mais reconhecido em termos sociais e profissionais.
(1) Attrition, indicador que nos indica a rotação de membros e que é calculada da seguinte forma: Total de cancelamentos dos últimos 12 meses / N.º médio de sócios desse mesmo período.
CURRICULO DO AUTOR: Miguel Pacheco
• Mestre em Gestão do Desporto pela Faculdade de Motricidade Humana.
• Coordenador do Curso de Técnico Especialista em Exercício Físico do CEFAD
• Chefe de Divisão de Projetos Desportivos da Câmara Municipal de Lisboa.
• Doutorando em Gestão do Desporto pela Faculdade de Motricidade Humana.
• Professor Convidado em várias Universidades.
• Diretor de Operações da Leirisport e do Europeu de Futebol, Euro 2004, em Leiria.
• Formador há 20 anos na área da Gestão do Desporto com especialização na Gestão de Espaços de Fitness, Marketing Pessoal e Informática.
• Consultor desportivo em vários projetos nacionais e internacionais, nomeadamente do Programa “Preparar e Planear Clubes de Futuro” do CEFD em 2001 e dos Sextos Jogos Africanos, realizados no Zimbabué em 1995.
• Prémio Professor Albino Maria de Investigação & Desenvolvimento em Gestão do Desporto, 2ª edição em 2012, atribuído pela Escola Superior de Desporto de Rio Maior
• Auditor de Qualidade.