jueves, 15 de octubre de 2015

O BOOM DA CORRIDA. OS PRÓS E OS CONTRAS

A corrida representa um fenómeno mundial, com milhões de praticantes a utilizarem ruas, jardins e praças das grandes cidades ou as zonas rurais junto das pequenas povoações. O crescimento exponencial desta atividade, nos últimos anos, tem as mais variadas razões, seja o convívio e autossuperação ou as questões de saúde e bem-estar. 



Este Boom da corrida tem vindo progressivamente a ganhar adeptos, pois é uma atividade acessível ao grande público, pela simplicidade inerente à sua prática: não é necessário nenhum espaço físico específico; no geral, as questões ambientais não são impeditivas; o equipamento para a prática não implica grandes despesas; pode ser executada de forma solitária ou em grupo. Estando na ordem do dia a preocupação com a saúde, a redução do tempo de inatividade e de stress, a busca de um corpo mais “definido” e a elevação da autoestima, esta alteração de comportamentos tem vindo a apresentar também um forte impacto na economia. Um estudo do IPAM, de 2014, refere que os praticantes portugueses desta modalidade gastam anualmente, em média, 118€ em calçado e 77€ em vestuário específicos, representando um valor de mercado estimado em 108 milhões de euros. 

A corrida é entendida pelas pessoas que a praticam como uma forma de realização de atividade física, sem que exista contacto físico e representando um baixo risco de lesões, comparativamente com outras atividades desportivas. No entanto, não é esta a realidade. A corrida é uma atividade física que exige um conhecimento técnico aprofundado por parte dos praticantes, senão é fácil desenvolverem-se lesões que impedem a prática temporária da atividade física ou, de forma mais grave, poderão tornar-se crónicas, causando grande desconforto e diminuição das capacidades motoras ou até impossibilidade de desenvolvimento de qualquer atividade física com todos os inconvenientes que isso comporta.

Salientam-se, apenas, alguns desses aspetos para se ter uma noção de como é complexo adquirir uma técnica correta de corrida que evite as lesões.
Inclinação do corpo durante a corrida – para a grande maioria das pessoas é difícil distinguir a ligeira inclinação do corpo para a frente que torna a corrida mais adequada das outras posições do tronco que podem causar lesão, como serão estes casos: flexão do tronco, arquear a zona lombar em excesso, inclinar para a frente em demasia, correr com o tronco em grande rigidez, entre muitas outras variantes que facilitam o aparecimento de lesões. 

Ataque ao solo – é muito frequente ser feito com o calcanhar, mas desta forma trava-se o movimento e possibilita-se o aparecimento de lesão em diversas zonas onde está ser exercida demasiada pressão. Se for feita com a parte anterior do pé, também se exerce muita pressão em outras zonas que podem lesionar. O ideal é ser feito com a parte mediana do pé, o mais alinhado possível com o centro de massa. Este movimento permite que os músculos do pé, do membro inferior e do core absorvam o impacto, protegendo, dessa forma, os joelhos e a zona lombar. O calçado usado pela maioria dos praticantes atualmente predispõe para que se faça o ataque ao solo com o calcanhar e, em geral, é difícil para as pessoas adquirirem a técnica adequada de correr, porque a corrida parece um movimento natural que todos os humanos conhecem e sabem fazer. 

Cadência – a cadência ideal de cerca de 180 passos por minuto, em que se contacta o solo durante o mínimo tempo possível, é muito diferente da cadência da maioria das pessoas que faz corrida, que é de cerca de 60 passos por minuto, causando mais carga em tendões e ossos no momento de contacto com o solo, sendo esta uma das principais causas de lesão.
Amplitude da passada – normalmente pensa-se que uma passada mais ampla permite correr maiores distâncias com menos passadas, contudo, este tipo de passada é uma importante causa de lesão. Para se aumentar a eficácia da corrida é importante desenvolver um bom ângulo da passada, que depende da flexibilidade – quanto mais o joelho subir maior será o ângulo.

Core e trem superior – pode dizer-se que, cineticamente, todo o corpo está ligado: os membros inferiores com a bacia, a bacia com o tronco e o tronco com os membros superiores. Portanto, uma técnica deficiente de corrida pode causar lesão em qualquer uma destas partes do corpo.  
Assimetrias – uma parte importante das pessoas tem assimetrias corporais que se evidenciam na corrida, sobrecarregando determinadas zonas do corpo. Para se evitarem lesões é fundamental permitir às pessoas que conheçam e tomem consciência das suas assimetrias corporais e aprendam as formas de as diminuir ou corrigir, no quotidiano e na corrida.

Calçado – existe uma corrente técnica e científica que considera o calçado minimalista como o mais adequado para se correr, porque permite que o contacto com o solo seja reconhecido pelo sistema nervoso central através da proprioceção e, dessa maneira, o cérebro teria acesso a informações que permitiriam à pessoa uma maior capacidade de decidir sobre a forma mais adequada de correr. Mas, atualmente, a grande maioria das pessoas corre com calçado compensado (com almofadas e solas espessas – muito diferente do calçado minimalista) com o objetivo de absorver o impacto, no entanto, este calçado muito disseminado entre os praticantes predispõe a que se corra de maneira incorreta e facilita o aparecimento de lesões.  

O Colégio Americano de Medicina do Desporto refere que uma das características de um bom par de ténis é a espessura reduzida da “almofada” do calcanhar, considerando que 6 milímetros ou menos será a melhor escolha. 

Outros aspetos a ter em conta – são importantes as questões relacionadas com a segurança. É perigoso correr em determinados locais pela possibilidade de atropelamento, quedas em ravinas, assaltos, entre outras. É preciso ainda ter cuidado com a hidratação (nem de menos nem em excesso), a nutrição (qualidade e quantidade de nutrientes a ingerir, de que forma e em que intervalos), cuidados a ter com a exposição ao sol, ao calor ou ao frio. A importância do aquecimento e do retorno à calma, sempre antes e no fim de correr. 

Competição – tem-se verificado como uma evolução desta atividade o aumento do número de competições de pequenas e longas distâncias por todo o mundo, por vezes com números impressionantes de participantes que integram as meias maratonas e maratonas. No entanto, todo o entusiasmo inerente à competição e ao alcance de melhores resultados leva a alguns exageros por parte dos participantes, a treinos extensos e com enorme sobrecarga. Esta situação vivamente desaconselhável gera um grande número de lesões causadas pela repetição de movimentos incorretos, dado ser assim que grande parte das pessoas acaba por correr. 

Gent num artigo de 2007, em que faz uma meta análise da bibliografia sobre as lesões causadas nos membros inferiores dos corredores de longa distância, encontra em algumas referências percentagens superiores a 90% de praticantes que se lesionaram. Outros artigos referem que, em média, anualmente, cerca de 65% a 80% dos corredores de qualquer distância têm lesões muito variadas: zona do calcanhar, joelho, bacia, zona lombar, escapular e cervical, síndrome da banda iliotibial, síndrome do stress tibial medial, dor patelo-femoral  (joelho de corredor), bursite trocantérica, tendinopatia patelar e lesão do glúteo médio ou tensor da fáscia lata, fascite plantar, tendinopatia de Aquiles, lesão dos gémeos, lesões isquiotibiais, fraturas por stress na tíbia, entre outras.

Em conclusão
É fundamental aumentar a percentagem de pessoas que fazem atividade física, de modo a prevenir os malefícios que advêm das doenças crónicas e do sedentarismo. A corrida pode ser uma opção, mas é preciso que os praticantes aprendam a técnica da corrida antes de o fazerem para, desse modo, se evitarem as lesões. Este é um desafio que todos enfrentamos e pensamos que, em conjunto, profissionais da saúde, da motricidade humana, do ensino, das autarquias, entre outros, encontraremos formas de colaboração e sinergias que aumentem o número de portugueses que praticam atividade física regularmente, de uma forma segura e com os devidos cuidados, para se prevenirem as lesões que podem advir de uma prática não adequada do ponto de vista técnico.   
Antes de iniciar esta prática deveria, idealmente, ser feita uma avaliação médica à pessoa para se ter a certeza que a prática da corrida é aconselhada e, sempre que possível, deveria ser feito o aconselhamento e o acompanhamento por um profissional de atividade física que identifique e promova as devidas correções e prescreva um plano de treino adequado ao individuo.


Francisco Mata – Licenciado em Ciências do Desporto, Mestre em Ensino da Educação Física nos Ensinos Básico e Secundários e Pós-graduado em Marketing e Gestão do Desporto

Pedro Ribeiro da Silva – Licenciado em Medicina, Mestre em Ciências da Comunicação, pós-graduado em Psicoterapia Corporal – Direção-Geral da Saúde

 
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